Tenho em mim todos os sonhos do mundo

quinta-feira, setembro 25, 2008 / Publicada por Rui Pedro /

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
Àparte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso?
Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Génio?
Neste momento Cem mil cérebros se concebem em sonho génios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?
nem um, Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.

Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fêz.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo.
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.

Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga de Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num pôço tapado.

Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.



Álvaro de Campos

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